Histórias nas quais as temporalidades se conectam e promovem uma série de modificações no tempo, presente ou futuro, não são pouco usuais. Em uma referência um pouco mais clássica da ficção científica, poderíamos citar a trilogia De volta para o futuro, dirigida por Robert Zemeckis. Em 2004, observamos o sucesso de bilheteria de Efeito Borboleta. Até mesmo dramas românticos que intercalam temporalidades foram criados, como Questão de tempo, em 2013. A própria série alemã Dark é um complexo e instigante prato cheio para aqueles que se interessam pela temática. No entanto, poucas narrativas foram tão bem estruturadas e repletas de emoção como observamos no drama de televisão sul-coreano Signal, exibido pela tvN em 2016. Antes de prosseguir, é importante deixar escrito que esse K-drama vai levar o seu sono embora ao longo dos alucinantes 16 episódios.
Nas últimas décadas, observamos o levante cultural da Coreia do Sul através de sua música pop (K-pop) e seus dramas de televisão (K-dramas), que tem conquistado uma expressiva audiência global e se tornado pauta de discursos midiáticos e trabalhos acadêmicos. Recentemente, o estrondoso sucesso de Parasita, de Bong Joon-ho, que conquistou diversos prêmios cinematográficos, dentre os quais o Oscar de melhor filme, também tem colaborado para pluralizar e complexificar as imagens da Coreia do Sul que circulam além-mar. Nesse sentido, produções televisivas como Signal, que fogem à lógica dos K-dramas com roteiros majoritariamente centrados em um romance, destacam-se no catálogo da Netflix brasileira.
Quinze anos atrás, uma criança foi sequestrada e, dias depois, encontrada morta. A polícia não conseguiu resolver esse crime. No entanto, o protagonista Park Hae Young (Kim Hyun Bin), criança até então, viu a mulher que havia levado sua colega de classe embora. A polícia não lhe deu ouvidos. Em paralelo, seu irmão de 18 anos é acusado de um crime que ele acredita ser impossível de ter cometido. Após cumprir sua pena, Park Seon Woo (Chani) comete suicídio. Desde então, Park Hae Young não confia nas forças policiais sul-coreanas. Quinze anos depois, em 2015, nos encontramos novamente com Park Hae Young (Lee Je Hoon), um policial cuja especialidade é fazer um perfil psicológico dos criminosos. Um dia, ele encontra um walkie-talkie sem bateria que o possibilita entrar em contato com o passado (2001, 1997, 1985 e outros anos) do policial Lee Jae Han (Jo Jin Woong), desaparecido desde 2001 após ser acusado de corrupção. Assim, Hae Young consegue informações privilegiadas sobre o passado e, principalmente ao lado da líder de equipe Cha Soo Hyun (Kim Hye Soo), abre novas investigações sobre os crimes passados que a polícia não conseguiu resolver.
Já no passado, a recém-contratada policial Cha So Hyun é designada para o mesmo setor de Lee Jae Han, sendo apresentada como uma “mascote” por ser a primeira mulher do departamento. Os demais policiais ficam sem jeito em recebê-la no local de trabalho, mas Lee Jae Han se mantém intacto aos seus princípios e se comportando da mesma forma. Não tarda, entretanto, para que os dois passem a trabalhar juntos e a desenvolver uma forte amizade – que poderia se transformar em algo mais. Ali, os colegas de trabalho têm observado que Jae Han anda sempre apegado a um walkie-talkie velho, mas que ele alega “dar sorte”. Assim, Jae Han começa a se envolver em casos obscuros e a apontar o dedo na cara de policiais e outros representantes poderosos, passando a incomodar, evidentemente, muita gente. Em paralelo, existe uma disputa política ocorrendo, e o chefe do departamento é transferido para outra cidade, abrindo espaço para a chegada do supervisor Kim Beom Joo (Jang Hyun Sung). Beom Joo é o típico caso de sucesso misterioso: ascendeu gradativamente a cargos mais altos e nutre relações obscuras com representantes políticos e donos de empresas multimilionárias.
Como todo clichê do gênero, ao se interferir no passado, o presente sofre modificações e isso se transforma em um grande dilema para o protagonista. Até que ponto é positivo que ele esteja em contato com Lee Jae Han? Vale a pena salvar a vida de uma vítima se outra pessoa morre em seu lugar? É prudente interferir no passado e arriscar uma mudança drástica no momento presente? Sem dúvida, as transformações ocorridas ao longo desses fluxos temporais colocam em xeque a consciência de Hae Young. No entanto, a situação se complica no momento em que o detetive Hae Young se depara com situações de seu próprio passado que ficaram pendentes.
Já Cha Soo Hyun mudou muito nos últimos quinze anos. De uma policial sem experiência que frequentemente se assustava com os acontecimentos cotidianos, transformou-se em uma mulher extremamente forte, pronta para liderar uma equipe com maestria, mesmo sob desconfiança de outros policiais homens do departamento. Cha Soo Hyun desenvolve certa afeição por Hae Young, embora desconfie de suas ações e sabedoria que são pouco explicadas, em virtude de estranhas conversas em um walkie-talkie. Em 2015, a detetive continua em busca de seu antigo parceiro Jae Han, desaparecido em 2001. Eventualmente, com apoio de Hae Young, ela pôde reencontrar os restos mortais de Jae Han no necrotério da polícia. O que levou Jae Han à morte? Mais uma vez, interferir no passado se torna urgente para que o presente não seja um ambiente de tanto sofrimento.
De volta à sua juventude, Hae Young presencia a prisão de seu irmão mais velho, Park Seon Woo, acusado de participar de um estupro coletivo de uma colega de classe. Após alguns meses de detenção – sendo ele o único punido pelo crime -, o rapaz retorna para casa e encontra uma família desestruturada. Dias depois, Hae Young encontra seu irmão desacordado, envolto de sangue. Teria Seon Woo cometido suicídio? A polícia sul-coreana teria sido incapaz de investigar o crime corretamente, levado Seon Woo a desistir de tudo agora que seu nome fora manchado? Qual a correlação entre Jae Han e Seon Woo? O que existe escondido nesse passado injusto e turbulento?
Em uma série de reviravoltas, por vezes surpreendentes, e atuações simplesmente brilhantes, Hae Young, Lee Jae Han e Cha Soo Hyun desafiam a macroestrutura policial da Coreia do Sul, ora reescrevendo o passado e lidando com as consequências no presente, ora constatando que há situações que não devem ser revertidas. Unida, a equipe de “cold cases” garante que o futuro/presente de Lee Jae Han seja mais brando. Ou será que nem tanto?
Ficha técnica:
País: Coreia do Sul | Direção: Kim Won Suk | Roteiro: Kim Eun Hee | Atores: Lee Je Hoon, Kim Hye Soo, Jo Jin Woong, Kim Won Hae, Jang Hyun Sung, Chani, Kim Hyun Bin| Episódios: 16 | Ano: 2016
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