MidiÁsia

O time ABC, uma abreviação para “Amanhã Brasil-China”, é uma organização sem fins lucrativos voltada para promover as relações entre Brasil e China por meio de eventos como palestras, workshops, parcerias, eventos presenciais, entre outros. O ABC possui chineses e brasileiros na equipe, visando ampliar a visão de chineses sobre o Brasil, assim como a visão de brasileiros sobre a China. 

A parte chinesa da equipe do ABC é composta por integrantes do clube ASIC, da Tsinghua University. ASIC é uma abreviação em inglês para Associação de Comunicação Internacional Estudantil (Association of Student International Communication, em mandarim: 清华大学学生对外交流协会). O ASIC já fez parcerias com países como Chile, Inglaterra e Estados Unidos, incluindo eventos com faculdades como Harvard University, Massachusetts Institute of Technology (MIT) e University of Exeter. Agora, o ASIC, sendo parte do time ABC, busca parcerias com universidades e organizações brasileiras. Larissa Jiayi, presidente de departamento do ASIC, e Elias Wu, líder do grupo de operação para o projeto no Brasil, toparam uma entrevista para explicarem mais sobre o projeto. Os alunos toparam uma entrevista com o MidiÁsia UFF, um time parceiro do ABC.

Um pouco mais sobre os entrevistados!

Elias Wu, cujo nome em mandarim é Wu Zixu (吴子序), sendo Wu o sobrenome, nasceu em Taiwan e completará 20 anos no próximo mês. Ele estuda automação na Tsinghua University e faz parte do clube de Kung Fu da universidade, além, é claro, de fazer parte do ASIC. Wu adora estudar sobre a história chinesa, europeia e americana (América como continente), então, está sempre interessado em aprender sobre novas culturas. No ensino médio, ele decidiu brincar de memorizar todos os países do mundo e conseguiu, embora já não lembre mais da maioria. O que ele mais gosta sobre a cultura chinesa é a literatura, principalmente poemas antigos. Ele espera poder compartilhar sobre seus gostos com as pessoas do Brasil.

Larissa Yang é metade brasileira e metade chinesa e tem o nome chinês Yang Jiayi (杨嘉怡), sendo Yang o sobrenome. Ela nasceu no Brasil e, ao longo dos seus 22 anos de idade, morou em Belém, Shanghai e Pequim. Mesmo após se mudar para a China, Larissa nunca deixou de se considerar brasileira e querer unir os dois países que tanto ama e que fazem parte de sua história. Ela estuda direito na Tsinghua University e trabalha em uma empresa que visa promover a cultura chinesa no mundo. Mantendo-se sempre próxima do seu interesse em unir Brasil e China, ela se tornou presidente de departamento do ASIC e tem atuado em projetos importantes, como o IMUSE e o HEYTA, que serão explicados mais à frente. Larissa é co-criadora do ABC junto com as brasileiras Beatriz Pollo, Letícia França e Maria Luiza Laranjeiras

O Começo do ABC

Entrevistadora Beatriz Pollo: Como que começou o projeto ABC?

Larissa Yang: Bom, o projeto começou com um encontro especial. Eu organizei uma delegação de estudantes chineses para fazer uma pesquisa acadêmica no Brasil. A visita fez parte da coleta de dados e dos estudos sobre oportunidades de cooperação no âmbito da iniciativa “Nova Rota da Seda” entre China e Brasil. Por coincidência, entramos em contato com o Instituto Confucius da PUC-Rio e marcamos um encontro para entrevistar a presidente do Confúcio. E foi lá que fiz amizade com a Triz (Beatriz Pollo). Ela já estudava mandarim e demonstrou grande interesse e vontade em promover as comunicações entre os jovens da China e Brasil. Trocamos ideias e ambições e decidimos unir amigos e trabalhar juntos para montar uma plataforma diferente, uma plataforma especializada em promover a comunicação entre brasileiros e chineses, também ajudando estudantes brasileiros a terem acesso às informações necessárias para aplicar e começar uma vida universitária na China. Com esses e outros objetivos, criamos a plataforma ABC.

À esquerda, alunos e funcionários do Instituto Confucius junto à delegação de alunos do Centro de Desenvolvimento de Competência Global (Center for Global Competence Development – CGCD) da Universidade de Tsinghua. À direita, Beatriz e Larissa em destaque, junto da funcionária Roberta e do aluno Vinicius.

Beatriz Pollo: Quais foram os primeiros passos para desenvolver essa parceria? 

Larissa Yang: Obviamente, depois de decidir construir a plataforma, o nome e o logo foram o segundo assunto à discussão. Queríamos um nome diferente, um nome jovem, um nome cheio de esperança e que demonstre nossa ambição. Passamos a semana toda trocando ideias e fazendo brainstorm, até um dia a Triz dizer “Amanhã Brasil China, que tal?” Eu amei o nome no momento que entrou no meu ouvido. Porque era isso que queríamos fazer, auxiliar e ajudar os jovens e talentos que construirão o amanhã entre Brasil e China. E, ao mesmo tempo, acreditamos que esse Amanhã será luminoso. Depois começamos a desenhar o logo e planejar os primeiros eventos entre estudantes. No meu ponto de vista, o primeiro passo foi e ainda está sendo encontrar pessoas que compartilham o mesmo sonho, que dançam no mesmo ritmo e amam o que fazem. E o resto se torna bem mais fácil. 

Beatriz Pollo: O primeiro projeto do ABC foi um workshop em dezembro, certo? Como foi isso?

Elias Wu: Eu tive um pouco de choque cultural ao trabalhar com a Triz e outros brasileiros. O inglês deles é bem fluente, sem nenhum sotaque, o que me deixou impressionado. Além disso, eu achei inusitado a maneira que os brasileiros organizam as suas agendas. Acredito que estudantes brasileiros têm uma agenda de estudos e descanso bem mais saudável que a gente na Tsinghua. Vocês dormem cedo e acordam cedo também, pelo visto. Esse foi um dos motivos pelo qual tivemos mais dificuldades em conciliar um horário para o workshop. Eu fui informado da possibilidade de um “sextou” diminuir nossa audiência brasileira e que talvez, se fosse no fim de semana, os brasileiros estariam descansando ou estudando para outras coisas. Por termos um fuso horário de 11 horas de diferença, acredito que escolher o horário de nossos eventos vai ser sempre um desafio. 

Larissa Yang: Sim, concordo. Nosso workshop aconteceu na manhã de sexta-feira no Brasil, quando já era noite aqui na China. O workshop foi sobre música brasileira e chinesa. Escolhemos o Edward Yang (Yang Zexia, em chinês 杨泽夏) para pesquisar e nos contar um pouco sobre melodias, performances e instrumentos chineses. A Triz foi a escolhida do lado brasileiro. Foi um evento divertido. Depois de Edward e Triz falarem um pouco, mostrando seus slides, a gente dividiu os participantes em grupos no Zoom para discutirmos sobre o tópico. Eu adorei conhecer as opiniões tanto dos brasileiros quanto dos chineses. 

Elias Wu: Eu estava preocupado se o evento ia ter muitos participantes. Comparado com Estados Unidos ou países da Europa, o Brasil não é um país tão conhecido por aqui. Fiquei em dúvida se teriam outras pessoas se interessando nisso tanto quanto eu sou interessado. No fim, tivemos um bom grupo de pessoas, um número ideal para esse tipo de workshop. Sobre o momento em que nos dividimos em grupos, no começo meu grupo teve dificuldade de começar a falar, porque ainda não nos conhecíamos bem. Mas, a partir do momento em que começamos a falar, a atmosfera ficou mais calorosa e pareceu que não tínhamos tempo suficiente para falar tudo o que queríamos. Nos familiarizamos um com o outro muito rápido e eu adoraria ter tido mais tempo no grupo. Um dos brasileiros até compartilhou seu número de WhatsApp comigo e continuamos a conversar por lá.

Larissa Yang: Eu considero um evento bem sucedido. Gostei muito do que vi.

Elias Wu: Eu também.

Print de tela tirado ao final do evento, com quase todos os participantes.

Beatriz Pollo: Vocês têm alguma palinha para compartilhar com o MidiÁsia UFF sobre como serão os próximos eventos?

Larissa Yang: Nós teremos uma palestra sobre BRICS com dois acadêmicos entendedores do assunto, um chinês e um brasileiro. Esse projeto já está sendo organizado. Ouvi pela Triz que o lado brasileiro também tem trazido boas ideias. Novos membros acabaram de entrar por um recrutamento do ABC, então, acredito que isso vai ajudar a fomentar ainda mais nossa parceria.

Elias Wu: Eu, particularmente, gostaria que tivéssemos um evento para falar sobre comidas e bebidas dos dois países. Eu adoraria conhecer mais sobre isso. É claro que eu preferiria um evento presencial, para que tenhamos aperitivos e eu possa comer essas comidas. Mas, mesmo se for online, vai ser interessante conhecer os pratos brasileiros. Aqui na China, temos uma diversidade de gostos. Por exemplo, a província de Fujian tende a comer coisas mais doces, assim como no meu país natal, Taiwan. Não comemos muitas coisas salgadas, picantes ou com cheiros fortes. Já as pessoas da província de Sichuan amam comida apimentada. Essas diferenças são um conhecimento que eu adoraria compartilhar com os brasileiros. Ah, eu também gostaria de falar sobre indústrias brasileiras e chinesas. A China tem crescido exponencialmente nos últimos 20 anos, principalmente, em indústrias como carros elétricos. Que tipo de indústrias o Brasil tem? Quais são as especialidades do seu país? Por exemplo, eu sei que a Alemanha é famosa por suas indústrias de carro e cerveja. E o Brasil? Eu espero poder descobrir logo sobre isso.

Sobre o ASIC 

Beatriz Pollo: Me conte mais sobre o ASIC, clube da Tsinghua Univeristy.

Larissa Yang: A Associação de Comunicação Internacional de Estudantes, Universidade de Tsinghua (ASIC), foi criada em março de 2003 sob a orientação do Escritório Internacional de Intercâmbio e Cooperação da Universidade de Tsinghua. O clube cria oportunidades de intercâmbio intercultural para estudantes da nossa universidade e promove a cooperação cultural entre a China e países estrangeiros. Nos últimos vinte anos, a ASIC organizou e co-organizou de forma independente vários projetos e atividades de intercâmbio cultural estudantil, e estabeleceu contatos amigáveis com universidades e organizações sociais em muitos países e regiões.As atividades incluem o Evento de Intercâmbio de Estudantes da Universidade dos EUA e da China, a Expo Cultural Internacional “Aldeia Global” e o “Embaixador do Diálogo de Janelas de Água e Madeira”. ASIC foi premiado com o “Top 10 Clubes Estudantis da Tsinghua University” 11 vezes. Essa associação acompanhou meus 4 anos de estudo em Tsinghua e é o meu segundo lar. 

Beatriz Pollo: Podem me contar um pouco mais sobre tais projetos?

Elias Wu: Um dos projetos que mais gostei de participar foi a Aldeia Global (Global Village), que é um evento que acontece no campus da nossa universidade e reúne participantes de mais de 52 países, incluindo o Brasil. A equipe do ASIC geralmente tem entre 20 a 30 membros, mas, durante esse evento, a gente chega a mais de 50 membros na equipe, de tão grande e trabalhosa essa exposição é de realizar. A Exposição Cultural Internacional “Aldeia Global” acontece uma vez ao ano, geralmente em maio, e eu participei pela primeira vez ano passado, quando ainda era calouro. Eu fui o líder do time de design e fizemos coisas bem interessantes, como criar “estampas de passaporte” para cada país. Se você fosse nos estandes de muitos países e conseguisse os selos, você podia concorrer a prêmios.

Exposição Cultural Internacional “Aldeia Global” de 2023.

Beatriz Pollo: E sobre o evento em parceria com universidades estrangeiras. Podem me contar mais sobre isso?

Larissa Yang: O nome da parceria é IMUSE (Initiating Mutual Understanding Through Student Exchange, em português: Iniciando Compreensão Mútua Através do Intercâmbio de Estudantes). É uma das nossas parcerias mais famosas. Foi fundada em 2007 e agora formou uma nova situação de intercâmbio cultural onde a Universidade Tsinghua, a Universidade de Pequim, Harvard e o Massachusetts Institute of Technology colaboram e os intercâmbios de verão e inverno entre a China e os Estados Unidos brilham. IMUSE recruta representantes de todo o mundo para discutir os problemas atuais e futuros de desenvolvimento e soluções da China e dos Estados Unidos, bem como do mundo. O mais recente projeto do IMUSE foi no nosso verão de 2023, entre os dias 27 e 30 de agosto. O evento foi presencial na China e foi chamado “Unleashing the Future:Tech Beyond Tech” (em tradução livre: “Liberando o Futuro: Tecnologia além da tecnologia”). o IMUSE é uma das parcerias de intercâmbio de jovens mais influentes no continente chinês. Também temos eventos similares com universidades da Inglaterra, e universidades do Chile.

Elias Wu: Tem também o HEYTA. Essa é uma parceria mais recente, que começou em 2018 e teve dois eventos online organizados principalmente Inglaterra, em 2020 e 2022, mais um evento presencial — em 2019 — e outro online — em 2021 — organizado pela nossa universidade. Apesar de eu estar há apenas um ano na equipe, eu já tive a oportunidade de participar do quinto evento HEYTA (Higher Education Young Talent Alliance, em português: Aliança de Jovens Talentos do Ensino Superior), uma parceria entre China e Reino Unido, cujo último evento aconteceu presencialmente na Universidade de Tsinghua, com apoio da Universidade de Exeter, entre os dias 4 e 6 de setembro de 2023. Foi interessante ver estudantes britânicos voando para Pequim só para participarem do evento. Assim como eu sou no ABC, eu fui um dos líderes do grupo de operação desse projeto e fiquei mais nos bastidores resolvendo questões que apareciam.

Entraves nas Relações Brasil-China e esperança sobre o futuro do ABC

Beatriz Pollo: O que você mais gosta no Brasil?

Larissa Yang: Eu gosto de nossa atitude positiva e alegre. O povo brasileiro magicamente consegue encontrar felicidade e força para ultrapassar os obstáculos da vida. E isso faz dos brasileiros um povo vibrante, um povo progressista, um povo abençoado e cheio de esperança. Então eu acredito que temos a habilidade, temos o talento de promover nossa economia, excluir pobreza e construir um Brasil melhor. 

Beatriz Pollo: O que você mais gosta na China?

Larissa Yang: Bom, falando da China, não tem como não mencionar sua história de 5 mil anos. O que eu mais admiro na China é a riqueza e profundeza em cultura, em história, que faz com que os chineses se unam como um só, que faz com que eles sigam a excelência e sempre vitoriosamente recuperem sua poltrona em posição ao mundo. E o desenvolvimento que a China adquiriu conforme 40 anos, foi incrível, foi realmente o milagre chinês e eu quero esse sucesso sendo duplicado no meu lindo lar, Brasil. 

Beatriz Pollo: Na sua opinião, quais são os entraves que você acredita existir nas relações Brasil-China? O que impede essas relações de se expandirem?

Elias Wu: Países latino-americanos quase nunca aparecem nas notícias aqui na China ou até mesmo em Taiwan. É engraçado que, mesmo que tenhamos grandes parcerias econômicas, ainda conhecemos tão pouco um ao outro. Tanto a cooperação governamental como a privada são de fato muito maiores do que eu imaginava, mas, devido à irrelevância geográfica e histórica, as pessoas não estão suficientemente conscientes disto e nem as notícias relatariam muitos eventos relacionados.

Larissa Yang: Claro que existe a distância física, como Elias falou. Brasil é um dos países mais distantes que existe na Terra em relação à China. E essa distância acrescenta o custo de transporte e comunicação, trazendo desafios para possíveis investimentos internacionais. A ausência de talentos que dominam ou pelo menos entendem os idiomas dos dois países também é um entrave que impede o aumento de investimento e negócios entre os dois países, cujo o ambiente jurídico, político e comercial são uma área desconhecida para ambas partes. 

Beatriz Pollo: O que você espera do ABC no futuro?

Elias Wu: Eu acredito que esse projeto vai abrir as portas das interações entre ambos os países, culturalmente e academicamente falando. É uma chance única para aprendermos sobre países que quase nunca aparecem nas notícias. Eu espero que o ABC cresça junto ao ASIC e inclua estudantes das mais variadas universidades do Brasil, para que possamos ter mais coisas para compartilhar e diferentes visões sobre isso. O lado brasileiro teve recentemente um recrutamento, então, estou animado para conhecer os novos estudantes do lado brasileiro.

ABC

Agradecimento especial ao ABC e ao ASIC!

Entrevista por Beatriz Pollo
Revisão por Juciano Rocha
Imagens: Reprodução


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